sábado, 25 de janeiro de 2014

PASSARINHEIRO



 Há dias, na minha ida à padaria Brioche do Forte pela manhã, avistava um casal de canários ciscando no estreito gramado junto à calçada da Avenida do Contorno, no bairro da Passagem, onde moro em Cabo Frio.
Gostava de vê-los procurando fiapos de mato seco para construção de seu ninho. Muito singelo e bonito.
Hoje ao regressar da padaria, lá estavam os canarinhos, catando o capim seco. Parei e fiquei observando o vai e vem do casal, quando vi do outro lado da avenida um rapaz aparentando uns trinta anos de idade com um alçapão armado, tentando atravessar. Chutei uma latinha de cerveja que estava caída junta ao meio fio, assustando os passarinhos que voaram para uma casa de cujo terraço pendia inúmeros ramos de bertalha e outras plantas.
O homem do alçapão ao completar a travessia da avenida, perguntou-me:
- O Senhor viu os canarinhos? Há dias tento prendê-los e não consigo.
- Você vai prender os canários? Que crimes eles cometeram?
O homem olhou-me surpreso e com uma cara de quem não gostou do que eu disse; retrucou:
- O Senhor está me gozando; eles não são bandidos. Eu sou passarinheiro; caço pássaros e passarinhos, os crio e às vezes vendo-os, apurando um dinheirinho.
- Escuta moço, eu quando era menino também vivia nas matas caçando passarinhos com gaiolas e alçapões; até pardal e rolinha eu pegava. Mas eu cresci; você deve saber; a gente cresce. Aprendi e me convenci de que todos os seres vivos da natureza têm um destino, uma finalidade nas suas curtas vidas.
 Veja; os passarinhos se alimentam de insetos, frutas, sementes e outras coisas; ao evacuarem as sementes e caroços não digeridos pelos seus estômagos pequenos, replantam as matas e florestas; se ficarem presos seus destinos serão interrompidos; não mais poderão voar e cantarão para o dono, um canto repetitivo e triste.
- O bem te vi, cumprimenta alegre todos que passam; “BEM TE VI”, como se estivesse anunciando alguma coisa.
-O Urubu tem penas pretas porque está sempre de luto; lá das alturas ele vê o morto no mato, rua ou asfalto e desce para limpar o local; é seu destino.
-A borboleta dança como uma bailarina, pôr sobre flores e folhas, encantando a todos com suas asas multicores, em sua vida frágil e curta.
-A galinha, resignada, põe seus ovos e serve de alimento para outros animais. Também é seu destino.
Como vê meu amigo passarinheiro, cada um tem um destino em seu curto tempo de vida; inclusive nós humanos.
Nas minhas voltas à padaria encontro sempre o passarinheiro, mas nunca mais o vi com gaiola e alçapão.
Os canários?  Continuam lindos e soltos.


                            

sexta-feira, 17 de janeiro de 2014

O CRAVO. QUEM DIRIA?



A Rosa espantada não acreditava no que os seus olhos viam. Encontrou o Cravo e o Jasmim trocando carícias e se beijando no jardim. Nunca na existência de seus antepassados soubera de uma situação igual a esta, pelo contrário, sempre houvera namoros entre Cravos e Rosas em todos os jardins do Mundo.
Agora diante daquela cena inesperada, a Rosa chorou. Primeiro de vergonha, decepção, depois de raiva e nojo.
Manteve-se altiva, não se despetalou, olhou horrorizada para o novo casal e foi embora, assombrada com a modernidade que estava ocorrendo no jardim do Senhor Éden.
Por ela passou a Camélia que após a queda de um galho, quase morreu, vivia triste circulando pelas alamedas do jardim.
- Camélia! Ei Camélia!
- O que foi Rosa; você está muito vermelha. O que houve?
- Querida! O Cravo e o Jasmim estão namorando; encontrei-os entre beijos e abraços embaixo da Samambaia Chorona.
- Calma Rosa! O Girassol, aquele amarelão bobão, que passa o dia todo olhando pro Sol, já havia me dito que o jardim do Senhor Éden está ficando muito esquisito. Até mosquito da dengue está morando lá. Horrível!
- Camélia, não chama o Girassol de bobão, ele admira o Sol porque o Sol é um astro.  Todo mundo admira os astros.
- Está bem Rosa, mas não se desespere não se despetale. Há muitas coisas acontecendo ao nosso redor que não sabemos. A Jardineira que estava triste, falou-me noutro dia que tem uma tal de Internet que vigia e sabe da vida de todo mundo. É a maior fofoqueira. Cuidado com ela minha amiga.
- Camélia, muito obrigado. Você me confortou, mas ainda tenho uma preocupação. Como vai ficar a música da minha vida?
- Rosa, na sua música, é o cravo que briga com você debaixo de uma janela; esquece ele; viva a vida como diz o poeta Gonzaguinha:
“É a vida! É bonita e é bonita. Viver e não ter a vergonha de ser feliz.”