terça-feira, 21 de maio de 2013

MEU VIZINHO MUDO









Tenho um vizinho mudo. Eu sempre passava por ele, trocava olhares, mas a pressa nunca permitiu que o percebesse melhor. Ele sempre calado, quieto; diariamente isso acontecia, e o tempo que não para foi passando.
Num dia chuvoso daqueles temporais torrenciais, me impossibilitou de sair de casa. Fui então ver meu vizinho mudo, com mais demora e levei um grande susto. Ele olhou nos meus olhos, mostrou-me vários detalhes da minha pessoa que eu desconhecia, mas estavam ali na minha frente.
 Foi um choque cruel.  Ele disse nos meus olhos, cara a cara, que eu estava mais velho, careca com alguns cabelos brancos dos lados, gordo quase obeso e barrigudo. O que aconteceu comigo? Perguntei a mim mesmo; logo eu que era um rapaz bonito, atlético, disputado pelas meninas do bairro. Foi o tempo; passou e não percebi.
 Agora, já sessentão, meu vizinho mudo mostra com toda sua imparcialidade, que estou descendo a escada da vida. Mais quarenta anos? Talvez eu não exista.  Eu nem me lembrava de que era mortal, mas ninguém é imortal nem os da academia de letras. É assim o período de vida de todas as coisas viventes: nascer, crescer, envelhecer e morrer.
O vizinho mudo não morrerá?  Não. Creio que não. Ele já existia antes do meu nascimento.
Ele está em muitas casas, impassível, olhando para qualquer pessoa, se você parar e olhar bem, ele lhe mostrará muitos detalhes interessantes.
Pra você saber: ele é tão sincero e verdadeiro quanto você deseja que seja. O espelho.



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